“Atentado ao futebol” ou “Um Campeão aberrante” ou “Os deuses estão loucos”

Qualquer um destes títulos, e muitos outros mais, serviriam para esta crónica, tal é a diversidade de adjectivos possíveis para classificar o desfecho deste Campeonato da Europa.
Mas eu já tinha avisado algumas pessoas (não o escrevi aqui por total falta de tempo, mas aqui o meu colega do lado sabe disso porque eu lho disse), porque depois de ter ido ao Porto na 5ª feira ver a meia-final entre a República Checa – para mim a melhor equipa do torneio – e esta mesma Grécia, previ que isto pudesse acontecer. Aquele jogo deu-me a fotografia do que poderia ser a final, e nunca partilhei do optimismo de quem achava que o título estava no papo, que ia ser a vingança com os gregos, ou a vitória mais fácil de todos os jogos, e até havia quem falasse em goleada. Eu não confundo pensamento positivo, esperança ou mesmo optimismo com irrealismo, e quem pensava assim estava a ver o filme completamente ao contrário. Só há duas explicações para isso: ou um total irrealismo ou então quem o disse não percebe patavina do que se passa dentro do campo.
De facto, só dois cenários eram possíveis: ou marcávamos cedo e isso obrigaria os gregos a abrir e aí sim, a vitória poderia ser facilitada ou, o que eu temia, iam ser 90 minutos a bater no muro e os gregos à espera de um golo caído do céu, tal e qual como contra os checos. Infelizmente foi isso que aconteceu.
Mas eu também tinha dito que preferia os checos na final, por duas razões: porque se perdêssemos, perdíamos com a melhor equipa do torneio, o que não é nada desprestigiante, e se ganhássemos era em glória, pelo mesmo motivo. De qualquer modo, seria um espectáculo, com duas equipas de ataque. Com os gregos, seria um jogo chatíssimo, como foi a meia-final, se ganhássemos não fazíamos nenhuma proeza e perdendo era uma vergonha. Não uma vergonha por nós, mas uma vergonha para o futebol.
Depois do desfecho, mantenho a ideia que já antes tinha da Grécia: não joga nem deixa jogar. Tal como o Tuguinho escreveu ali em baixo, ganhou o anti-futebol, mas eu vou ser mais incisivo: foi um crime de lesa-futebol uma equipa destas ganhar o campeonato. Eles pura e simplesmente não jogam futebol e, para mim, é uma completa aberração que uma equipa assim, que só destrói, vá ostentar durante 4 anos o título de Campeã da Europa. É um nome que lhes fica bastante mal, porque não fizeram, em nenhum jogo do torneio, NADA que justificasse ganhar fosse o que fosse, nem sequer passar à segunda fase. Foram ganhando jogos sem saber ler nem escrever. Na final, um canto, uma cabeçada, um golo, e por aí se ficaram.
Agora dizem-me: mas os golos é que contam e fazem os resultados, e eles ganharam à Espanha, França, República Checa e a nós duas vezes. É a eficácia, e só. Mas com vitórias destas, o futebol retrocedeu 40 anos: eles foram desenterrar o “catenaccio” que os italianos tinham inventado na década de 60. Se é esta a fórmula para se ganhar campeonatos daqui em diante, vou deixar de ver a bola. Pensava que já ninguém jogava assim. E de facto, ninguém joga. Porque eles jogar é coisa que não fazem.
Qualquer equipa de segundo plano joga mais futebol do que este caricato campeão europeu. Suécia, Dinamarca, Holanda, Espanha, Itália, França, Croácia, até a própria Suíça, uns mais e outros menos, mas todos fizeram alguma coisa para jogar futebol. A Grécia será, seguramente, uma das equipas que menos jogou neste campeonato e em toda a história do futebol, em campeonatos do Mundo e da Europa. Eu já vejo estes torneios desde 1974 e apenas uma vez uma equipa tão anti-futebol esteve perto de ganhar um campeonato: foi a Argentina no Mundial de 1990. Foram eliminando adversários nos “penalties” e também com um jogo ultra-defensivo. Na final com a Alemanha estiveram quase a levar o jogo para prolongamento, mas felizmente uma intervenção oportuna do árbitro a 5 minutos do fim inventou um “penalty” que deu a vitória à Alemanha. Mas foi melhor assim do que se tivesse havido um campeão aberrante como este.
O que mais me enraivece não é ter perdido, mas ter perdido assim. Razão tinha eu para querer os checos. Ao menos, se perdêssemos, era contra uma equipa de classe.
Mas nestas coisas é preciso também uma pontinha de sorte, e esta não quis nada connosco nem com os checos. De facto, os deuses do Olimpo enlouqueceram completamente.
Resta-nos o consolo, para além de ficarmos em 2º lugar, de termos sido os campeões das restantes 15 equipas, aquelas que quiseram jogar e dignificar o futebol. De resto, não foi só Portugal que perdeu: todos perdemos, perdeu o futebol em toda a linha.
Depois disto, estou como o Tuguinho: vamos ver se se qualificam para o Mundial. Espero que os futuros adversários encontrem o antídoto que varra do panorama futebolístico mundial um concorrente tão negativo. Até porque eles não têm nada para mostrar ao mundo. Nos futuros arquivos do campeonato da Europa, quando o nome da Grécia lá aparecer, alguém se vai lembrar de algum facto de relevo desta equipa? De algum jogador? De alguma característica, a não ser o anti-futebol?
Todos os vencedores, e muitas vezes os vencidos, deixaram a sua marca para a história. A Hungria de 54 perdeu a final do Mundial com a Alemanha mas tinha-a goleado por 8-3 na primeira fase. Era a melhor equipa do mundo na época. O Brasil de 58 mostrou um jovem de 17 anos de nome Pelé, com Garrincha, Didi, Vavá. A Inglaterra de 66 tinha Bobby Charlton, Bobby Moore, Gordon Banks. O Brasil de 70 foi das melhores equipas de sempre em todo o mundo, com Pelé, Tostão, Rivelino, Jairzinho, Gerson, Carlos Alberto. Diz-se também que foi o melhor campeonato de sempre. Em 74, ganhou a Alemanha de Beckenbauer, Maier, Breitner, Hoeness e o “bombardeiro” Müller, e perdeu a “laranja mecânica” de Cruijff, Neeskens, Rep, Krol. Perdeu mas nunca mais ninguém se esqueceu dessa Holanda, que voltou a perder em 78 na Argentina, já sem o seu mítico número 14. E quem não se lembra do Brasil em 82, com Zico, Sócrates e Falcão, que foi posto fora de prova pela Itália de Paolo Rossi (que marcou os 3 golos nesse jogo memorável), Conti, Tardelli, Cabrini, Gentile, Scrirea e Zoff, que seria a campeã? E em 86 a Argentina de Maradona e a sua mão de Deus? Do Europeu de 92 todos se lembram da Dinamarca de Brian Laudrup, que interrompeu as férias para ser campeã da Europa. Em 88 foi o ressurgir da grande Holanda, com o famoso trio Gullit, Van Basten e Rijkaard e o não menos famoso Ronald Koeman, outra equipa para a história que resgatou as derrotas de 74 e 78. Em 84 foi a geração de Platini, Giresse, Tigana, Fernandez e Bossis que deu à França o título europeu, para em 98 e 2000 serem Zidane, Thierry Henry, Desailly, Deschamps e companhia a dar um duplo título mundial e europeu aos franceses. Poderia continuar por aqui fora a evocar equipas que ficaram na História, sem esquecer os portugueses em 66 com Eusébio, em 84 com Chalana ou em 2000 com Figo, Rui Costa e João Pinto.
E agora pergunto: desta Grécia, qualquer dia, alguém se vai lembrar de quê?

Kroniketas, sempre kontra as tretas e o anti-futebol

Comentários

Mensagens populares deste blogue

O Maratonista - Jornal de Notícias Discretas (III)

25 de Abril sempre?

Com espírito pouco natalício