Lá vêm eles com o mesmo sermão!...



Pois, o título não é debalde. Nesta altura da quadra natalícia, além dos bons sentimentos e da solidariedade*, também somos assaltados pelo cariz excessivamente comercial do evento.
Ok, calem-se lá, todos! Tanto os que nos chamaram neo-hippies como os que nos chamaram comunas, os que nos apodaram de judeus e os que nos adjectivaram de fundamentalistas!Primeiro, nem sequer somos religiosos, e segundo, também não queremos regressar aos natais pobrezinhos mas honrados. Mas achamos que se devia fazer qualquer coisa.
Falando agora por mim**, prefiro muito mais apenas a presença de alguém que tenha gosto na minha companhia do que qualquer presente que me pudesse oferecer. Se não gosto de receber prendas? Claro que gosto, toda a gente gosta! E mais ainda se gostar do presente! Mas o que detecto de ano para ano é a pressão do consumismo a consumir-nos os natais***, que deviam ser calmos e relaxados, apenas com aquela dose de nervoso miudinho que antecede os grandes acontecimentos. Passamos as semanas que o antecedem num reboliço de compras, apenas porque tem de ser. Tem mesmo de ser?
E as crianças, senhor? As crianças, coitadinhas, são submersas por montanhas de prendas da família e dos amigos e levam horas a abrir os presentes, aos quais vão prestar 5 segundos de atenção porque têm de passar aos próximos... Depois admirem-se se derem em pequenos monstros egoístas, que à menor contrariedade se exaltam, desistem ou divorciam.
Essa é talvez a maior diferença que encontro quando comparo com os natais da minha infância. Recordo-me perfeitamente do Natal de 1973****, em que as minhas prendas de natal foram uma pequena caixa de Lego, com rodas dentadas e outras peças especiais que permitiam novas construções, e um exemplar da "Volta à Gália" do Astérix. Todos os leitores com menos de 30 anos devem estar neste momento a chorar e a pensar "coitadinho, era tão pobrezinho!", mas não, não era. Éramos uma simples família da classe média, das que agora preferem pedir empréstimos para passar as férias em Cancun em vez de irem para a Costa, que gastam o 13º mês (e o 14º e o 15º, que parecem desconhecer não existirem) em prendas para as criancinhas e que julgam que "poupança" é alcunha de um personagem dos morangos com açúcar...
E se pensam que tais prendas me entristeceram ou decepcionaram, estão muito enganados - até recebi tudo o que tinha pedido. E diverti-me imenso e não senti falta de mais nada.
Actualmente, todos parecem pensar que têm direito a tudo, independentemente do que realmente possuem ou podem alcançar. Não têm.
O problema são os outros! Os outros têm e eu também quero, os outros vão-nos dar, também temos de comprar algo! And so on, and so on... É realmente difícil quebrar o ciclo. Talvez se começarmos devagarinho, uma coisinha de cada vez, o consigamos fazer.
Só para que conste, ainda tenho o tal Lego e o livro do Astérix, que por vezes releio, sempre com prazer.

tuguinho, cínico natalício (acende-se e apaga-se)


* é como se chama agora à caridade de outrora, não sei porquê - solidariedade era se as tias fossem passar temporadas com os sem-abrigo, a menos que a palavra tenha mudado de significado entretanto.

** mas sabendo que o Kroniketas me secundará

*** a repetição é propositada

**** ok, 'tá certo, estou a ficar usado...

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