O lado parvo de Miguel Sousa Tavares (2)

Começa a não haver paciência para as crónicas de Miguel Sousa Tavares no jornal “A Bola”. De facto, chega a parecer quase inverosímil como é que um homem com o prestígio que ele tem, um dos comentadores e fazedores de opinião mais proeminentes do país, com lugar garantido como colunista nos jornais mais importantes (Público e Expresso), jornalista e escritor com vários livros publicados, consegue tornar-se tão primário, irracional e obtuso quando toca a futebol (à semelhança do que acontece quando o assunto é tabaco ou caça). Aí, perde a razão e a capacidade de análise e envereda pelo fundamentalismo mais primário que se possa imaginar, conseguindo ver o que não existiu e não vendo o que realmente aconteceu em campo. Aliás, estas crónicas n’A Bola têm sido um manancial para a paródia por parte de Ricardo Araújo Pereira, que anda há meses a compilar todos os dislates dos anti-benfiquistas para depois desmontar com grande eloquência todo o argumentário mais delirante.

Nas últimas jornadas do campeonato, perante a inevitabilidade que se anunciava de o Benfica ser campeão e perante a luta entre Cardozo (SLB) e Falcão (FCP) pelo troféu de melhor goleador do campeonato, MST entreteve-se a descobrir irregularidades nos golos marcados pelo Benfica que só existiram na sua imaginação.

Primeiro foi no jogo na Madeira perante o Nacional (0-1, golo de Cardozo), onde MST descobriu um fora-de-jogo no golo da vitória que, para além dele, só o esclerótico Pôncio Monteiro vislumbrou (dessa anémona falarei em próxima ocasião). As imagens televisivas mostraram bem que o golo foi limpo.

Depois foi no jogo com o Olhanense (5-0, três golos de Cardozo), onde MST mais uma vez vislumbrou um golo de Cardozo em fora-de-jogo que voltou a não existir. Acresce ainda que, no primeiro golo de Cardozo, marcado de penalty por mão de um defesa do Olhanense na grande área, MST conseguiu descobrir que o penalty foi mal marcado quando o defesa tinha os braços abertos, mas já considerou irregular uma hipotética mão de Aimar no 5º golo, em que beneficiou de um ressalto quando a bola foi chutada contra si a um metro de distância e ele tinha os braços encolhidos junto ao peito. Ou seja, na sua análise “sui generis” MST considera irregular uma jogada em que a bola é chutada à queima-roupa contra um jogador que não pode evitar o contacto, mas acha regular uma jogada em que a bola é interceptada pela mão de um jogador que tem os braços abertos…

Finalmente, no jogo da última jornada com o Rio Ave (2-1, dois golos de Cardozo), que foi o da consagração do Benfica como campeão, MST ainda foi mais longe no seu delírio analítico anti-Benfica. Começou a sua crónica com a afirmação espantosa de que Falcão foi o melhor marcador do campeonato mas que lhe roubaram esse troféu! Depois foi desenvolvendo uma narrativa quase digna de Agatha Christie, tão misteriosos são os acontecimentos relatados. Nem Hercule Poirot conseguiria decifrar esta intrincada trama.

Primeiro, na jogada do 1º golo, começou por descobrir, mais uma vez, um fora-de-jogo de Saviola, que fez um primeiro remate que o guarda-redes repeliu para a frente, para mostrar que houve irregularidade. Contudo, esqueceu-se convenientemente duma coisa: a bola chegou aos pés de Saviola vinda dum defesa que tentou aliviar a bola para fora da grande área com o pé esquerdo mas fê-lo tão desastradamente que chutou contra si próprio e a bola ressaltou da sua perna direita na direcção oposta, para a sua própria baliza. Assim a posição de fora-de-jogo deixa de existir, porque a bola vem de um defesa adversário.

Em seguida, quando a bola ressalta do guarda-redes e é amortecida pela coxa de outro defesa, virado para a sua baliza, antes que este tivesse tempo para aliviar a bola Cardozo levantou a perna esquerda e chutou a bola para a baliza, marcando assim o 1º golo. Mais uma vez MST descobre um facto inexistente para provar a sua delirante tese de que Falcão foi privado do troféu de melhor marcador: é que, pelo seu ecrã azul, MST conseguiu ver que não foi Cardozo que marcou o golo, mas sim que este resultou dum pontapé que Cardozo deu na perna do defesa, fazendo este marcar um golo na própria baliza. Ou seja, para MST o golo é 3 vezes falso: porque foi precedido dum fora-de-jogo de Saviola, porque não foi marcado por Cardozo e porque este cometeu uma falta sobre o defesa que supostamente marcou o golo. Aqui chegado, fiquei a pensar se MST estaria lúcido ou a delirar! Chega a parecer que o cérebro lhe congela quando pensa no foculporto!

Perante tamanho arrazoado de disparates, só me resta deixar duas sugestões a MST: não uma vacina contra o anti-benfiquismo, porque essa doença não tem cura e afecta a grande maioria dos adversários do Benfica. Mas sugiro-lhe que, caso não o tenha, compre um gravador de DVD onde possa gravar as imagens dos jogos, passá-las ao ralenti, pará-las nos momentos críticos e ampliá-las para ver melhor; e que, caso também não o tenha, compre um livro com as regras do futebol para ver se consegue aprender o que é o fora-de-jogo e não vir para os jornais inventar irregularidades que não aconteceram, porque só lhe fica mal.

As melhoras, Miguel. Espero que continue a escrever com a qualidade e lucidez que é habitual noutras áreas.

Kroniketas, sempre kontra as tretas

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